Credenciamento de Bens e Serviços

A regra das contratações públicas, como sabemos, é “licitar”, contudo além das possibilidades expressas do artigo 24 da Lei 8.666/93,  que possibilita a contratação por “dispensa de licitação”, ainda encontramos  no artigo 25 do referido  diploma legal um rol “não exaustivo” de possibilidades para a inexigibilidade de licitação.

Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I – para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

II – para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

III – para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.

Quando falamos em contratação pela via da inexigibilidade, geralmente ligamos as possibilidades às previstas no artigo 25, esquecendo quase sempre da contratação por meio de credenciamento, um tema pouco abordado na doutrina e muito significativo no contexto dos municípios que mais recentemente e com muitas dúvidas quanto a formalização dos respectivos procedimentos, vem operacionalizando a rotina dos profissionais de saúde por esta forma.

A problemática da contratação de médicos, especialmente em municípios pequenos (onde a clínica de especialidades os desestimulam a atuação em consultórios próprios) e distantes das metrópoles, não os incentivam à fixação de residências ou a assumirem vagas efetivas (geralmente por valores abaixo de suas expectativas).

Dessa forma, a contratação destes profissionais passou a ocorrer mais recentemente pela via do credenciamento de serviços, sendo necessário antes, justificar o procedimento pela inexistência de aprovados em concurso, bem como pela inviabilidade de licitação para a administração, interessando o credenciamento para este objeto.

A matéria não é regulamentada no diploma de licitações e muitos Tribunais de Contas não disciplinaram ainda a modalidade como alternativa viável, assim como o tema inexiste no contesto da maioria dos Estados Brasileiros.

O Estado do Paraná desde 2007 regulamentou essa forma de contratação, e, ainda que a legislação careça de uma atualização, louvável a iniciativa do ente ao tratar do tema numa época em que pouco se falava sobre a sua utilidade prática, nos seguintes termos:

Credenciamento é ato administrativo de chamamento público, processado por edital, destinado à contratação de serviços junto àqueles que satisfaçam os requisitos definidos pela Administração, observado o prazo de publicidade de no mínimo 15 (quinze) dias úteis e no máximo de 30 (trinta) dias úteis. (artigo 24 – Lei 15.608/2007).

Já o Projeto de Lei nº 6.814/2017 que intenta alterar a Lei 8.666/93, em seu artigo 5º, sobre o instituto anuncia:

Credenciamento: processo administrativo de chamamento público em que a Administração Pública convoca interessados  em  PRESTAR  SERVIÇOS  OU  FORNECER  BENS  para  que, preenchidos  os  requisitos  necessários,  credenciem-se  no  órgão  ou  na  entidade  para executar o objeto quando convocados”.

O TCE/MS inovou ao enfrentar o tema em seu Manual de Peças Obrigatórias, Resolução nº 88/2018,  da seguinte forma:

“Para o credenciamento DE SERVIÇOS, por meio de ampla divulgação e observância aos princípios da igualdade e da impessoalidade, a administração deve convocar todos os interessados no objeto, dispondo-se a contratar aqueles que manifestem interesse e que satisfaçam os requisitos estabelecidos, fixando, ela própria, o valor que se disponha a pagar aos adjudicados que não competirão entre si”.

O credenciamento de profissionais da saúde resultou numa alternativa viável para a contratação de médicos, porquanto não enseja direitos trabalhistas, décimo terceiro ou férias e também anuncia possibilidades para outros objetos, a exemplo de serviços funerários, convocação de professores, hospedagem fora da sede do órgão, manutenção da frota de veículos, contratação de profissionais para breves reparos, manutenção de ar condicionado, de computadores, dentre tantos outros que se desdobram inclusive para a aquisição de bens, considerando que “todas as vezes em que a concorrência for inviável porque todos os profissionais que se predispuserem ao atendimento do objeto pelos critérios definidos no Edital puderem ser contratados pela administração”, não haverá concorrência entre eles, e por isso a licitação será inexigível.

O credenciamento será instruído por procedimentos atípicos, a exemplo do ratifico em momento diferente do exarado na inexigibilidade comum, do edital e homologação (documentos incomuns nas inexigibilidades ordinárias), sendo então necessário que os operadores de licitações se desvinculem de conceitos pré-concebidos para a formalização eficiente dos procedimentos necessários a correta formalização deste processo atípico, vez que nele encontraremos a oportunidade de alteração do Edital no decorrer da vigência do credenciamento (para inserir regras de melhorias necessárias à administração), a necessidade de republicação dos instrumentos convocatórios (para ampliar a chamada pública), dentre outros procedimentos diferenciados para este processo regido por especificidades, veja isso no meu ebook, CLIQUE AQUI.

Uma grande dificuldade enfrentada pelos aplicadores do instituto é a compreensão da atipicidade do instrumento de credenciamento, que se difere em muito da concepção tradicional de contrato e se esse conceito diferenciado não puder ser compreendido pelo gestor, estar-se-á aplicando o termo de credenciamento equivocadamente como a um contrato, ainda que este não pressuponha prévio empenho e nem possa mencionar valor certo e nem garantir a remuneração dos profissionais por valor “igual” todos os meses.

Há muitos entendimentos equivocados no meio e credenciamentos formalizados totalmente distanciados de suas regras especiais, o que pode representar eminentes perigos à administração pela via da judicialização da matéria.

Ainda temos muito o que debater sobre o tema, grandes controvérsias, especialmente relacionadas aos objetos que efetivamente poderão ser contratados por essa via, esperanças que depositamos no Projeto de Lei nº 6814/17 que finalmente irá abordar explicitamente a questão. Enquanto isso, importa a aplicação do instituto pelas regras que temos, pelos posicionamentos dos Tribunais de Contas pátrios, sendo certo que por esta forma democrática e impessoal de contratação, muitos problemas poderão ser resolvidos inclusive (e especialmente) face a especialização dos profissionais atuantes, que precisam se preparar para a desvinculação de velhos conceitos e permitir a correta compreensão do verdadeiro sentido do credenciamento. Eis um grande desafio para esta década.

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