Adorei este artigo publicado pelo colega Estevan Facure no Jusbrasil Newsletter e acho valido compartilhar.
Fala sobre a “outra face de um processo litigioso” que todos nós advogados devemos alertar nossos clientes.
Sempre gosto de falar para os meus clientes que um processo judicial é um jogo de xadrez, no qual o ingresso de uma ação equivaleria ao movimento da primeira peça, o que abre possibilidade para milhares de possíveis resultados. Vale destacar, ainda, que é um xadrez demorado e que o lapso temporal para sua conclusão pode destruir justamente o que a pessoa objetivava proteger em primeiro lugar.
Ainda que nós tenhamos bem claro quais são as etapas do processo (petição inicial, audiência de conciliação, contestação, etc…) a realidade de fato (o que acontece na vida real) pode interferir drasticamente na decisão de um juiz e mudar tudo de um dia para a noite. É impossível saber quanto tempo um processo durará, ou o que juiz vai decidir, ou qual será a defesa da outra parte, ou quais serão os pedidos formulados pela outra parte, ou como as partes irão se portar ao longo dos duros anos de tramitação processual e etc.
A própria parte que entrou com um processo não é a mesma quando o processo acaba. Relembremos Heráclito: “Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou”.
Vale diferenciar, ainda, a atuação na área de família das demais áreas do direito. Enquanto nas demais áreas do direito lidamos precipuamente com patrimônio, nas causas familiares lidamos com sentimentos, responsabilidades paterno-filiais, extensão do direito de convivência do filho com familiares, o desenvolvimento psicológico das crianças e adolescente, tudo isso sempre mesclado com diversas amarguras, frustrações, ressentimentos, desilusões e sonhos destruídos.
Em um judiciário cada vez mais falido, em que ações simples se estendem por anos na justiça e que, claro, nem sempre traz uma sentença justa, devemos ter muita cautela antes de tomarmos qualquer decisão.
O advogado, assim como qualquer outro profissional, almeja receber os seus proventos e não há pecado nisso, mas devemos informar os nossos clientes dos potenciais danos de cada ação. Por isso, é extremamente necessário a contratação de um advogado especialista na área, ou seja, de um advogado sensível e adaptado para lidar com esses sentimentos aflorados.
Cito como exemplo a ação declaratória de alienação parental. Acredito que em toda família exista algum grau de alienação parental contra alguma pessoa específica, até mesmo nas famílias em que os pais continuam casados.
Hoje, vendo processos de alienação que se arrastam por anos na justiça para, ao final, obter um laudo psicológico inconclusivo sobre a existência ou não da alienação parental, frustrando sobremaneira as expectativas do Autor, gosto de advertir sempre meus clientes sobre a real necessidade e sobre as possibilidades de êxito do processo.
O pai ou a mãe que recebe um processo em sua casa, entregue por um oficial de justiça em folhas secas e letras frias, já se coloca em uma posição de embate absoluto. Essa pessoa, que agora virou “Ré” em um processo judicial, olha para trás e se lembra de tudo o que passou para chegar até ali, revive sentimentos e dissabores, como não poderia ser diferente.
E aqui, fica sempre a pergunta, a ação judicial litigiosa era realmente necessária?
Muitas ações poderiam ser facilmente resolvidas com um bom diálogo. E, ainda que fosse necessária a ação, existem maneiras de suavizar o impacto da visita do oficial de justiça.
Não me levem a mal, não trato aqui de um diálogo pueril digno de contos de fadas. Me refiro a um diálogo adulto, no qual as partes, em posse de informações valiosas (ex. como os juízes costumam decidir casos análogos), abrem mão dos seus respectivos egos para chegarem a uma resolução que melhor atenda os interesses de seus filhos. Ser pai e mãe exige sacrifícios mútuos, sempre. Muitas vezes, a melhor solução passa longe do que seria decidido pelo judiciário. Quem sabe o que é melhor para você: Um juiz que tem milhares de processos para julgar ou você mesmo? Cada família apresenta suas peculiaridades que são muitas vezes ignoradas por uma sentença-padrão de um juiz.
Muitos clientes narram, também, a absoluta impossibilidade de diálogo com a outra parte, mas ao entrar em contato direto com elas, recebo logo a outra versão. Confrontando essas realidades antagônicas e somando esforços para resolver questões complexas da maneira menos gravosa possível, consegui obter grandes êxitos ao longo desses anos de carreira. O maior êxito de todos, com certeza, é a manutenção da estrutura familiar e do diálogo entre as partes.
Sem florear meu pensamento, assevero que toda separação conjugal traz graves impactos aos filhos, principalmente de ordem psicológica, mas não há necessidade de se agravar ainda mais a situação. O exercício da paternidade e da maternidade exige sacrifícios mútuos de ambos os pais, como já mencionamos.
Se o diálogo entre os pais é verdadeiramente penoso para ambos, pois que as partes vejam isso como um sacrifício a ser feito pelo filho, que não tem culpa de nada.
Que maravilha quando existe um diálogo entre os pais e o mínimo de respeito mútuo. Quantas brigas em vão e inoportunas são refreadas. Quanto estresse não é evitado. Quanto o judiciário estaria desafogado…
Muitas vezes, ainda, os problemas começam a surgir após um novo relacionamento dos pais, com o surgimento de uma nova madrasta ou padrasto que não respeita a autonomia da vontade alheia. Nestes cenários, só existem duas soluções saudáveis: ou a pessoa termina esse novo relacionamento ou realiza um trabalho intelectual para que o (a) novo (a) parceiro (a) compreenda a estrutura familiar anterior e passe a respeitar todos os agentes.
Concluindo, o foco das partes e do advogado em um processo judicial é batalhar pela manutenção: da estrutura familiar, de um ambiente saudável para que as crianças possam crescer, do respeito mútuo e do diálogo fluido. Não é porque está escrito “julgado procedente o pedido” que o Autor ganhou a ação, não, muito pelo contrário, muitas vezes a decisão “favorável” vem a duras penas, como o abalo irreversível de uma estrutura familiar.
Artigo por: Estevan Facure
Fonte: Jusbrasil