Muitas tem sido as dúvidas país à fora acerca da possibilidade de antecipação de pagamento para contratos em andamento, considerando que a Medida Provisória 961/20 autoriza tal possibilidade, mediante o cumprimento de alguns pressupostos, dentre eles a previsão da antecipação e das exigências asseguradoras do cumprimento do objeto, no edital. Regras postas como medidas paliativas auxiliares no enfrentamento da crise instaurada.
O certo é que não temos respostas prontas para todas as situações concretas desses tempos difíceis, considerando que inexistem precedentes jurisprudenciais ou doutrinários para acudirem os inéditos tempos. Contudo, o sensato é que busquemos soluções pontuais caso a caso, e, mais do que isso, que as justificativas para as decisões (que ultrapassam questões técnicas, visto o alcance político, econômico e social) estejam materializadas nos autos, pontuando as razões de decidir e as individualidades de situações que diferem entre si, pois cada ente tem uma realidade diferente, ainda que os medos comuns imponham a mesma problemática.
Nesse norte, nada seguro, importa definir o que de pouco se tem de certeza, a exemplo dos limites para dispensa de licitação (artigos 24, I e II da Lei 8.666/93) que foram alterados para todos os objetos pelo menos enquanto perdurar a situação emergencial (no mínimo até 31 de dezembro do corrente – Decreto Legislativo nº 06/20).
Quanto a antecipação dos pagamentos, maior dúvida a imperar na referida MP, é preciso se acautelar quanto a sua aplicação que destoa nas interpretações, inclusive das Cortes de Contas pátrias, porquanto as consultas que respondiam antes a quesitos como a possibilidade de antecipação por critérios objetivos, dentre os quais constar dos editais a possibilidade e as garantias, já não podem ser rigorosamente observados, considerando que não assistiremos somente a contratações novas (e aí o atendimento dessas regras se impõem), contrariamente, se quisermos garantir a operacionalização de contratos em andamento ante a retomada da normalidade, é preciso garantir a sobrevivência das empresas contratadas que enfrentam a problemática de não se desestruturarem para a execução dos objetos paralisados e ao mesmo tempo, garantirem a sobrevivência dos seus empregados e a manutenção de suas despesas.
Este é um tema que teremos que enfrentar, independentemente da letra da lei e do excessivo processualismo e “sangue nos olhos” pelos ávidos pela aplicação radical dos normativos que NÃO SERVEM como respostas prontas e gerais para os dias de hoje.
Finalmente quanto ao Regime Diferenciado de Contratações RDC, objeto ainda estranho às pequenas estruturas (especialmente em razão da sua razão de ser originária), dada a notória necessidade de desburocratização que nos incomoda há tempos (e nesse ponto somos obrigados a compreender que o direito, por vezes, se contrapõe à razoabilidade, dada a sua discrepância estática ante a dinamicidade da evolução da sociedade), talvez novos rumos sejam adotados inserindo de vez essa forma de contratação no cenário nacional, outro ponto que teremos que “pagar para ver”.
Estamos vivenciando tempos estranhos, situação atípica, e a realidade que se arregala diante de nossos olhos requer soluções igualmente atípicas, inviáveis de interpretações exageradas e de radicais posicionamentos, oportunidade em que só após ultrapassarmos a fase difícil de realidade estranha, para avaliarmos as situações pelo norte da boa ou da má-fé, único critério que entendo efetivamente válido no “final das contas”.
Eis o limite que devemos dar a interpretação de toda norma ora editada para mitigar a aplicação de conceitos, que não duvido nada, logo serão desconstruídos para dar lugar a novas práticas.
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