Por mais que eu fale de Estudos Técnicos Preliminares – ETPs, o tema não se esgota, pois o relatório que advém deste obrigatório estudo talvez seja o mais importante instrumento da fase de planejamento, considerando que irá embasar o Termo de Referência e o próprio edital.
Portanto, justificativas obrigatórias da Nova Lei de Licitações – NLL precisarão constar do relatório de viabilidade.
O grande problema é que quem não sabe fazer ETP no regime da Lei 8.666/93 (em tempos onde as boas práticas e os Tribunais de Contas direcionam para a sua formalização), encontrará maior dificuldade se tentar migrar para a NLL sem esse conhecimento, dando ensejo a interrupção das licitações pelas Cortes de Contas (ou penalizações no controle posterior), e, ainda a impugnações de editais, desnecessariamente.
O caminho na maioria dos municípios brasileiros parece bem longo, considerando que as boas práticas passaram a ser alvo de preocupação dos órgãos há pouco, e há quem ainda defenda por ai que esta tal “estudo técnico preliminar” não existe, é invenção de poucos.
Por falta de planejamento pautado nos ETPs, diversos Tribunais de Contas vem penalizando agentes públicos, a exemplo de recentes decisões proferidas pelo TC/TO que aplicou em prefeito e pregoeiro de determinado município, multa na ordem de R$ 6.000,00 (para cada um) por ausência de estudo técnico (processo nº 6400/2020 – ACÓRDÃO TCE/TO Nº 215/2021-PLENO – 05/05/21), e em outro processo entendeu irregular o certame pela ausência de planejamento baseado em estudos técnicos prévios (processo nº 14272/2020 – ACÓRDÃO TCE/TO Nº 214/2021).
O TC/MT vem decidindo reiteradamente o que transcrevo do processo n° 17.276-6/2019 cuja decisão foi proferida em 19/10/2020: “a elaboração do estudo técnico preliminar constitui a primeira etapa do planejamento de uma contratação e se faz muito importante, pois garante a viabilidade e o levantamento dos elementos essenciais que servirão para compor o termo de referência e o projeto básico. A ausência do referido estudo pode acarretar em contratações incapazes de atender a demanda do Ente, ocasionando o desperdício de recursos ou a impossibilidade de contratar.”
O Tribunal de Contas de Goiás também tem recomendado a seus jurisdicionados “que façam constar explicitamente nas peças técnicas que componham o projeto básico ou termo de referência, os critérios e levantamentos in loco adotados para quantificação dos serviços, bem como que façam constar do processo que instrui a fase interna do certame, as justificativas, históricos, bibliografias e demais estudos técnicos que subsidiem os critérios adotados para serviços cuja natureza enseje uma previsão de demanda a surgir” (Acórdão Nº: 1716/2021).
Praticamente todos os Tribunais começam a exigir o encaminhamento de estudos técnicos nas contratações públicas, o que alguns órgãos ainda não entenderam é que quando se fala na necessidade de melhorias no processo de precificação ou na quantificação do objeto, ou ainda, em imposições feitas “desnecessariamente” reduzindo à concorrência, os TCEs estão a exigir um melhor planejamento, e, consequentemente, a materialização deste planejamento na fase interna da licitação culminando no relatório de viabilidade (onde se concluirá, dentre todas as soluções de mercado, porque se chegou àquela determinada).
Portanto, erros na fase interna da licitação poderiam ser minimizados, senão eliminados, pela correta formalização dos estudos técnicos preliminares. Nesse sentido já discorri no meu artigo abaixo:
E nesse seara, a Nova Lei de Licitações trará ainda muitos procedimentos e critérios que precisarão ser definidos e justificados nos estudos técnicos, senão vejamos:
Será sempre necessária a fundamentação/justificativa para o sigilo de informações/procedimentos; e para:
- o estabelecimento de MARGEM DE PREFERÊNCIA para bens manufaturados e serviços nacionais e para a aquisição de bens reciclados, recicláveis ou biodegradáveis;
- a estipulação de MEDIDAS DE COMPENSAÇÃO comercial, industrial ou tecnológica;
- a Exigência de que os SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO E ASSISTÊNCIA TÉCNICA sejam prestados mediante DESLOCAMENTO DE TÉCNICO ou disponibilizados em unidade de prestação de serviços localizada em DISTÂNCIA COMPATÍVEL com suas necessidades;
- a exigência de vistoria no local da obra.
E também será necessário motivar nos ETP determinadas condições do edital, tais como: exigências de qualificação técnica, (mediante indicação das parcelas de maior relevância técnica ou valor significativo do objeto); de qualificação econômico-financeira; critérios de pontuação e julgamento das propostas técnicas, nas licitações com julgamento por melhor técnica ou técnica e preço; regras pertinentes à participação de empresas em consórcio, e ainda:
Inversão de fases – A regra na NLL é o que conhecemos hoje como “inversão de fases”, ou seja, analisar os documentos de habilitação apenas do vencedor, mas, motivadamente (agora exceção), a fase de habilitação pode anteceder as propostas e lances (no pregão) desde que especifique os benefícios de adoção da exceção.
Modalidades presenciais – A regra na NLL é a preferência para a forma eletrônica (tanto do pregão como da concorrência), para a realização da modalidade presencial deve haver motivação.
Exigência de apresentação de amostras ou prova de conceito e certificação de projetos e de corpo técnico.
A não utilização do catálogo eletrônico próprio e de padronização ou dos modelos de minutas também deverá ser justificada por escrito e anexada ao respectivo processo licitatório, ou seja, dentro dos ETP.
A previsão de utilização de mão de obra, materiais, tecnologias e matérias-primas locais e o critério de julgamento pelo tipo “Técnica e Preço”, igualmente precisam ser motivados na fase preparatória da licitação.
Sendo assim, a melhor forma de detalhar os itens obrigatórios que devem constar dos ETPs, parece consistir no relatório que o órgão pode chamar como queira (eu prefiro chamar de “Relatório de Viabilidade”, posto que o seu objetivo será atestar a viabilidade técnica e econômica da solução encontrada), desde que finalmente compreenda a sua necessidade e utilidade, neste caminho sem volta da nova era das contratações públicas, onde finalmente o planejamento há muito resistido, assume a sua relevante posição.
Espero tê-lo convencido de que os erros hoje cometidos na elaboração da fase da licitação (que chamamos “interna”), seja em qual procedimento for (desde a definição do objeto, dos critérios de julgamento, da precificação, da quantidade, etc), foram cometidos por inadequado planejamento e que seja sob qual terminologia for, poderiam ter sido corrigidos se elaborados os estudos técnicos, que você pode até nem saber, mas já faz (e de forma deficiente), portanto.
Então vamos lá: Onde você está errando? E mais, vai encarar os ETPs e finalmente “planejar o que comprar”?